Análise – SpiritFarer

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Thunder Lotus
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Thunder Lotus
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Cada vez que eu me despeço de uma pessoa. Pode ser que essa pessoa esteja me vendo pela última vez.
Paulo Coelho/Raul Seixas

Viver é uma grande aventura com início, um meio e um fim, e no meio disso tudo, vivemos nossas vidas cercados de narrativas, de encontros, desencontros, amores, desamores e também de despedidas, até que a última despedida é a nossa. Spiritfarer é um game sobre isso, despedida, apego, cuidado e lembranças, tudo nesse jogo permeia esses conceitos, e não poderia ser diferente, pois SpiritFarer não é um jogo sobre morte, é um jogo sobre vida.

Uma nobre missão

No jogo você encarna Stella, uma moça jovem e sorridente, com a missão de substituir Caronte, o barqueiro que na mitologia grega era responsável pela travessia das pessoas do mundo dos vivos para o mundo dos mortos.

Pra isso Stella e seu gatinho de estimação, contam com um grande barco, cabendo ao jogador customizar este barco recolhendo recursos, para assim acomodar da melhor forma todos os espíritos passageiros, até que eles estejam prontos para partir. Poderia ser algo impessoal, se os espíritos deste barco não tivessem uma ligação estreita com a vida de Stella, e conforme você os liberta, o jogo vai contando um pouco da vida da garotinha, além de liberar novas features como minigames para colher recursos e novas mecânicas.

Meditar é preciso

Vida no Mar, fazendinha feliz

O oceano é mais antigo do que as montanhas e está cheio com recordações e sonhos do tempo.
H.P. Lovecraft

Grande parte do game se passa no oceano, um oceano além vida com diversas ilhas, todas inspiradas em lugares bucólicos como vilas europeias ou campos japoneses por exemplo. Nele você deve desbravar todas as localidades, procurando novas almas para integrar seu barco, durante estes trajetos você deve resolver pequenos conflitos, atender alguns desejos e cumprir algumas missões, que vão sendo catalogadas de forma não linear em seu inventário.

SpiritFarer consegue combinar mecânicas simples de gerenciamento de recursos e exploração, permitindo que você construa pomares, plantações, desenvolva receitas, além de diversas atividades que vão sendo liberadas conforme você customiza seu barco. Todo esse trabalho é conduzido de forma leve, relaxante, geralmente não punindo o jogador caso ele seja imprudente, uma característica importante do jogo, pois ele é de fato um game relaxante, sem pretensões de frustar o jogador. Spiritfarer é no fundo um grande plástico-bolha em formato da game.

Não, não é um chefe. Mas alguém que precisa de ajuda.

Numa folha qualquer
Eu desenho um navio de partida
Com alguns bons amigos
Bebendo de bem com a vida. Toquinho

Passageiros ilustres

Mas não é só de gerenciamento que vive SpiritFarer, durante suas explorações é preciso sempre dar atenção para sua tripulação. Os espíritos que embarcam com você são caracterizados por animais, eles transbordam toda a personalidade das pessoas, para que você entenda mais da personalidade daqueles espíritos.

O carisma desses personagens e a gentileza comovente de seus diálogos, faz de SpiritFaher único, os desenvolvedores souberam trabalhar toda a carga emotiva de suas histórias, que são complementadas por tarefas bem específicas e que envolvem os elos mais efetivos dos seres humanos: amores não correspondidos, refeições afetivas, lembranças amargas e arrependimentos, os tormentos dos personagens são trabalhados de uma forma muito especial, e a mecânica do jogo te permite abraçar esses espíritos, uma adição simples mas sensível, que combina com o espírito afetivo do jogo.

Enquanto explora, evoluiu, constrói e melhora seus equipamentos, é preciso cumprir as missões dos personagens, que levam então para o objetivo final do jogo, que é conduzir as almas para o Portal Eterno, esse é momento mais comovente do jogo, já que os personagens precisam lidar com a despedida da vida, algo que todos relutam, e lutam, mas não escapam.

É justo notar também os outros personagens do jogo, como comerciantes, viajantes e entidades, que também são retratados como animais, com exceção dos espíritos que não viajam, que são vestidos por uma capa e olhos translúcidos.

Pelos poderes de Grayskull…

A arte de SpiritFarer

É importante falar sobre os gráficos desse jogo, eles são de fato especiais. O trabalho artístico do jogo é fabuloso, com personagens desenhados à mão e movimentação semelhante com animações de cinema, a riqueza de detalhes nos personagens, principalmente no protagonista e no gatinho beiram a perfeição. Vale ressaltar o incrível trabalho de iluminação e efeitos visuais, que saltam ao olhos dado a tamanha riqueza e bom gosto artístico. Ainda que os cenários não sejam, às vezes, tão ricos quanto os personagens, eles transmitem o sentimento proposto pelo game de forma competente. SpiritFaher é facilmente um dos jogos indies mais bonitos já produzidos.

Trilha sonora gostosa

A arte da música é a que está mais perto das lágrimas e das lembranças.
Oscar Wilde

Música é um fator importante na narrativa de SpiritFarer, na maior parte do jogo a trilha sonora será uma bucólica calma canção do mar, mas o jogo muda isso de forma drástica quando se entra em mares revoltosos, ou se encontra no caminho um conjunto de águas vivas luminosas. O trabalho sonoro do jogo é impecável, com referências musicais que lembram grandes obras dos games, como Chrono Trigger por exemplo. A música compõem também os espíritos viajantes, muitos deles possuem seus próprios instrumentos, que revelam um pouco da sua personalidade, revelando instrumentos musicais, nuances artísticos de almas felizes.

Também não sou chefão, mas mando no pedaço.

Trabalho duro de marujo

Apesar das explorações locais, boa parte do trabalho em SpiritFaher é manter seu barco o mais aconchegante possível. Pra isso o jogo não foge da obrigação de atividades mais repetitivas, revelando o espírito de jogo de farming que ele é, atividades como regar plantas, cortar troncos de árvores, tear fios, construir e coletar ingredientes para desenvolver receitas e outras atividades vão consumir boa parte da sua experiência de jogo.

Para realizar essas atividades Stella e seu gatinho contam com uma única ferramenta, a Luz Eterna, uma pequena bola de luz capaz de se transformar em diversos itens e ferramentas. É possível jogar com uma outra pessoa, que controla o gatinho e pode realizar tarefas de gerenciamento e coleta com a Stella, o recurso funciona mas é bem opcional, não mudando muito a experiência de gameplay.

Falando sobre as atividades, particularmente fiz a maioria das atividades com um sorriso no rosto, mas confesso que me cansei um pouco de algumas, principalmente as que envolvem condições climáticas, como coletar águas vivas, meteoros e raios na garrafa. Falando em clima, a mudança climática em tempo real do jogo é importante para determinar certas atividades, por diversas vezes será preciso esperar o dia amanhecer para continuar a navegação (isso em boa parte do gameplay, depois as coisas ficam um pouco mais fáceis).

Ainda sim, o game tem um clima gostoso de viagem no mar, eu simplesmente adoro games que te colocam no controle de uma embarcação, ou nave e te permite customizar e viajar pelo mundo, esse clima de viagem me cativa, e SpiritFarer consegue criar esse clima muito bem.

Conforme você avança, o barco vai ficando grandão.

Exploração cadenciada

SpiritFarer tem um jornada relativamente longa, ainda mais se tratando de um indie, tudo acontece de forma cadenciada o suficiente para não te tirar da tela. Sua progressão também tem conceitos de jogos no estilo metroidvania, sendo preciso alguns upgrades no barco para acessar áreas específicas, isso aumenta a vontade de exploração. Esse tipo de progressão pode incomodar alguns, principalmente quem está acostumado com obras mais ligeiras, Spiritfarer pode parecer um pouco massante por apresentar novas mecânicas e facilidades de forma bem lenta. Melhorias como viagens mais rápidas, atalhos, movimentos e novas mecânicas são desbloqueadas gradativamente, é preciso um pouco de paciência e desprendimento de tempo para fechar o jogo.

Despedidas são sempre tristes

E você corre e corre para alcançar o Sol, mas ele está se pondo. Dando a volta até surgir novamente atrás de você.
Time (Dark Side of the Moon) – Pink Floyd

Um jogo adorável

SpiritFarer é um jogo único e inesquecível, sua sensibilidade narrativa e artística é comparável a grandes clássicos indies como Braid, Inside e Celeste. A maturidade do enredo, combinando elementos mitológicos e filosóficos maravilhosos, o colocam em um ponto fora da curva dos jogos mais mainstream, mesmo que o jogo não seja para todos. Eu só tenho a agradecer a Thunder Lotus Games pelo trabalho realizado, e espero ansiosamente por novos trabalhos desse estúdio canadense.

Terminar SpiritFarer é triste, pois o sentimento que fica é de perda, mas como tudo na vida morre, o que resta é seguir em frente.

 

SpiritFarer está disponível para PC, Xbox One (Gamepass day one) e Ps4. Esta análise foi feita usando o Xbox One X e também a versão para PC.

Análise – SpiritFarer
Conclusão
SpiritFarer é uma obra de arte permeada de sentimento e carisma. Um jogo sensível e comovente que merece sua atenção, mesmo que gerenciamento de recursos não seja sua praia.
Gráficos
9.5
Som
9
Jogabilidade
9
Diversão
9
Prós
Narrativa adorável
Gráficos lindos
Trilha sonora bonita
Contras
Progressão um pouco lenta
Alguns poucos glitches e lags, mesmo no Xbox One X
9
Viciante

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