Análise – The Ascent

LANÇAMENTO
29/07/2021
DESENVOLVIDO POR
Neon Giant
PUBLICADO POR
Curve Digital

O gênero cyberpunk sempre foi para mim algo fantástico! Venho acompanhando a evolução do gênero com obras como Deus Ex, System Shock e Shadowrunner, sem contar Nightlong (um point-and-click dos anos 90) e Shadowrun (do saudoso e fantástico SNES), culminando nos atuais Cyberpunk 2077, Deus Ex Humankind Divided, para citar alguns exemplos notórios.

Como resultado, temos obras riquíssimas onde cenários distópicos misturam o caos vibrante das cidades do futuro, as grandes conspirações corporativas para o perpétuo controle das massas pelos mais poderosos e as questões éticas e morais sobre o próprio significado de humanidade em mundos que o corpo humano não é mais um santuário, mas sim um laboratório. Cada vida, mais do que nunca, não passa de uma cifra no grande esquema da sociedade corporatista – que seria uma degeneração do capitalismo onde as corporações se tornaram os governantes de fato.

Seguindo esta temática extremamente fértil, temos o promissor The Ascent, que foi anunciado há algum tempo e finalmente chegou às nossas mãos, e felizmente ao Game Pass no lançamento, tanto para PC como para os consoles Xbox Series! A proposta do jogo é diferente de outros jogos do gênero: enquanto System Shock, Deus Ex e Cyberpunk 2077 foram produzidos como RPGs com perspectiva em primeira pessoa, e Shadowrunner seguiu uma linha de RPG tático (similar aos Fallout clássicos), The Ascent apostou em um modelo de twin-stick shooter. Se a aposta foi boa ou não, vamos conferir a seguir!

Modos de Jogo e Mapa

O jogo possui apenas o modo de História, e dela vamos falar um pouco por se tratar de um dos pontos altos da obra: você começa sua jornada como um operário da corporação The Ascent, responsável pela manutenção de umas das hubs de habitação da Arcologia da empresa, que é uma torre gigantesca onde se concentram os negócios da corporação e já viu dias melhores. Após descobrir as condições precárias em que a Arcologia se encontra, o choque maior é descobrir que a corporação declarou falência publicamente (relaxem que esse é apenas um minispoiler já que isso fica claro nos primeiros minutos de jogo).

Essa é uma alternativa narrativa muito bem pensada, já que raramente vemos em jogos cyberpunk as corporações fora da caixinha de “titãs indestrutíveis”. A corrida desenfreada de outras corporações para absorver a massa falida de The Ascent, apesar de explorada de forma rasa no jogo, contrasta maravilhosamente com o aparente clima de normalidade com que os habitantes da Hub continuam a tocar suas vidas.

A tônica do jogo é mostrar como a vida humana é secundária no grande esquema do corporatismo, e os combates que ocorrem frequentemente são a representação simbólica e perfeita disso: inimigos atacarão ignorando totalmente pedestres que circulam pelas vielas e praças de The Ascent. Não serão raros os corpos inocentes explodindo com tiros dos inimigos – e os seus tiros de contra-ataque! No começo bate um certo remorso, mas depois de um tempo você passa a ignorar as perdas humanas brutais que ocorrem nos combates – que afetam minimamente o progresso do jogo. A analogia da “indiferença dos gigantes” se aplica perfeitamente ao jogo: nós humanos somos indiferentes à quantidade de formigas que dizimamos diariamente, simplesmente por serem pequenas demais para percebermos.

O mapa do jogo é, basicamente, a estrutura da Arcologia da Corporação The Ascent, e seu progresso espelha simbolicamente o nome do jogo: A Ascenção. Você começa nos túneis de manutenção do coração moribundo da torre, até posteriormente chegar aos níveis mais altos, relegados apenas aos grandes magnatas da corporação. Seu progresso é realizado conforme descobre uma rede de conspirações que interfere diretamente no destino de The Ascent, e o mapa reflete muito bem as etapas da narrativa. A estrutura caótica das hubs de habitação mais populosas se reflete muito bem no mapa: é fácil se perder entre os prédios sobrepostos e a floresta sombria de neon do ambiente da Arcologia. Definitivamente, a ambientação de The Ascent é um dos seus pontos altos!

Mesmo assim, temos o trabalho infame de apontar méritos mas também defeitos, no que diz respeito ao mapa do jogo um falha bem notável fica clara quanto mais você joga: o backtracking do jogo é imensamente frustrante! Pra quem não está familiarizado como termo, backtracking se refere basicamente ao “ir e voltar” no mapa, geralmente para cumprir missões ou simplesmente voltar a uma loja. As estações de metrô – que funcionam como os pontos de viagem rápida do jogo – são muito mal colocados e em boa parte das vezes você prefere ignorar e ir a pé ao seu destino. Assim, a estrutura caótica da Arcologia, que esteticamente se apresenta como um ponto forte, na prática acaba por atrapalhar na jogabilidade do jogo.

Interface, Dificuldade e Jogabilidade

Como costumo fazer em minha análises, o primeiro ponto que gosto de destacar é a localização dos jogos para o português, que infelizmente não foram bem feitos pela equipe da Neon Giant. A tradução de menus e legendas foi parcial, e serão várias as vezes que você verá textos em inglês misturados com textos em português. Resta ficarmos na torcida para que a equipe seja atenciosa com os não-falantes de inglês que precisam desse recurso funcionando plenamente para curtir o jogo totalmente!

A interface do jogo é bem simples, e por ser muito bem montada sua simplicidade é um ponto alto. Tudo que você precisa saber está na tela: suas habilidades, barra de HP e de energia estão bem localizadas e você consegue acompanhar as informações até nos combates mais frenéticos. Dois pontos que já não ajudam muito são os mapas e o indicador da quantidade de esquivas que você pode realizar: o minimapa é praticamente inútil, sendo útil apenas durante combates; o indicador de esquivas fica localizado no “disco” que indica o personagem, com setas muito pequenas que demorei pra achar como referência visual.

O mapa completo é ainda mais confuso e com frequência você não saberá para onde ir para encontrar itens ou objetivos. No geral, a interface mais acerta do que erra, com informações bastante explicativa sobre armas, equipamentos defensivos e mods (que são passivas que voce pode equipar no personagem).

The Ascent possui três níveis de dificuldade, acessíveis nas opções de jogabilidade do menu. Joguei na dificuldade Normal e, no geral, o jogo te desafia o bastante sem ser frustrante – com exceção da última luta! Uma dica para quem for começar é ter bastante atenção ao nível dos inimigos caso queira, como eu, explorar livremente o mapa sem ficar preso unicamente às missões principais. A atenção é necessária pois o nível dos inimigos é baseado na área em que eles aparecem, e por isso, no começo do jogo vai ser comum você esbarrar em inimigos bem mais fortes do que você.

Sobre a jogabilidade, The Ascent não é um RPG! Acho importante destacar pois tendo em mente esse simples fato suas expectativas serão atendidas de forma mais realista: o jogo é um twin-stick shooter de respeito, com controles responsivos e, como já falado, que utiliza de alguns recursos de RPGs, e um interessante sistema de cobertura onde você possui um botão para se abaixar, e um botão para mirar alto: ao abaixar qualquer objeto à sua frente vira uma cobertura, e ao mirar alto você ganha um bônus na chance de atordoar inimigos. Vale lembrar que seus inimigos podem também se abaixar atrás de coberturas, e inimigos pequenos não são atingidos por seus tiros altos! Pra completar, o botão de esquiva é essencial para as luta mais caóticas e longas, e os dois slots de habilidades podem ser a diferença entre viver e morrer em The Ascent.

A princípio o arsenal do jogo parece bastante limitado, mas conforme você avança novas armas serão disponibilizadas – e com elas novas maneiras de combater efetivamente seus inimigos: armas balísticas funcionam bem contra humanos e mal contra robóticos, enquanto que armas de energia tem o efeito contrário, para citar um exemplo. O sistema de itens defensivos é bem simples, onde existem itens que favorecem sua defesa física mas te deixam exposto a dano incendiário, ou equipamentos mais equilibrados caso você não queria ficar trocando de equipamentos para se ajustar a cada combate. O que muda no sistema de equipamentos é que quanto maior seu núvel, maior a chance de obter equipamentos com raridade maior – o bom e velho esquema de cores de praticamente todo RPG moderno.

O ponto positivo é que, com exceção dos seus pontos de habilidades conquistados a cada avanço de nível, você pode trocar livremente seus equipamentos, habilidades e mods até mesmo no meio de combates. As habilidades podem ser redefinidas em lojas específicas no jogo, então experimentação é a chave para você descobrir o estilo de jogo que mais se ajusta a você! Isso pode ser visto como algo positivo, mas tendo em vista que The Ascent é um jogo de história linear com apenas um modo de jogo, isso pode acabar limitando bastante fator replay do jogo.

Talvez com o sucesso que o jogo conquistou nos anos que se seguiram entre seu anúncio e lançamento possam permitir a extensão da experiência, seja com conteúdos de história adicional, ou mesmo com a adição de novos modos de jogo. Mas nesse aspecto, estamos apenas especulando formas de manter o jogo relevante para além dos primeiros meses e lançamento.

Gráficos, Som e Diversão

Desde seu anúncio, um dos pontos altos de The Ascent sempre foi sua ambientação e sua qualidade gráfica. Mesmo não tendo jogado com raytracing ativado (até o fim dessa análise, o recurso só foi confirmado para a versão de PC do Game Pass) a forma como o jogo valoriza sombras e luzes é espetacular! Andar pelas vielas dos níveis mais baixos – e mais pobres – da Arcolodia de The Ascent, ou visitar seus bares e cassinos em busca de novas missões foi uma das experiências cyberpunk mais satisfatórias que tive recentemente! Jogando no Xbox Series S, não senti nenhum problema de performance, até mesmo nas áreas mais populosas do mapa ou durante as mais caóticas lutas. Definitivamente, os gráficos do jogo são um dos seus pontos altos.

Mas a grande surpresa positiva que tive foi na área de efeitos sonoros: trilha sonora, atuação de voz e efeitos sonoros são impecáveis! As músicas tem uma pegada cyberpunk, as atuações de voz são excelentes, fazendo soarem críveis até os diálogos que são realizados em línguas não-humanas. Os efeitos de tiro são ótimos e, como gosto de falar, você “sente o peso” dos disparos das armas. O único defeito que percebi no departamento sonoro é que, com mais frequência do que considero aceitável, alguns efeitos sonoros entram em loop: assim, você ficara ouvindo sons de tiros repetidamente de um combate que ocorreu minutos atrás. Ainda assim, não é algo que tire o brilho do excelente trabalho que foi realizado!

Assim, com uma jogabilidade bem estruturada e efeitos gráficos e sonoros espetaculares, jogar The Ascent é uma experiência bastante divertida! Seus poucos defeitos técnicos não são capazes de impedir que você curta cada momento do jogo: vale apontar que, no lançamento do jogo, o modo Cooperativo Online estava bastante instável, mas a empresa está ciente e trabalhando para melhorar este aspecto do jogo. Do ponto de vista do valor de replay, é mais uma questão pessoal que vejo como aspecto negativo: é comum que nós queiramos estender o máximo possível nossa experiência com bons jogos, e no estado atual do jogo infelizmente não me vejo voltando à Arcologia depois de terminar o jogo, a não ser para as ocasionais “caças de conquistas”.

Por fim, como sempre fica no ar a pergunta: o jogo é divertido? E a resposta, definitivamente, é sim!  Cada minuto que tive – seja atirando, correndo, desviando de disparos, mísseis e granadas, ou apenas explorando o universo de The Ascent e absorvendo sua atmosfera cyberpunk magistralmente executada – foi plenamente aproveitado!

Esta análise só foi possível graças ao Xbox Game Pass! O jogo já está disponível para Xbox Series X|S e PC (via App Game Pass PC) e pode também ser adquirido por meio do nosso link afiliado no final desta análise.

Análise – The Ascent
Conclusão
Com gráficos, trilha e efeitos sonoros e jogabilidade espetaculares, The Ascent é uma ótima iteração do gênero cyberpunk. Backtracking frustrante e um valor de replay baixo podem limitar um pouco a diversão. Mesmo assim, é um twin-stick shooter mega recomendado!
Gráficos
9
Jogabilidade
8
Som
9
Diversão
8
Prós
Ambientação cyberpunk espetacular
Trilha sonora e efeitos sonoros fantásticos
Gunplay responsivo e sistema de cobertura criativo
Contras
Backtracking frustrante
Pouco valor de replay
8.5
VICIANTE
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