Durante muito tempo o PC foi a casa dos jogos de gerenciamento, clássicos como Sim City, Civilization, Roller Coaster Tycoon e Theme Hospital nos mostraram como é gerenciar um grupo de pessoas que vivem e participam de uma sociedade.
Graças aos profissionais de UX, que conseguiram portar a jogabilidade de mouse e teclado para os gamepads, a geração atual pode desfrutar deste estilo de jogo muito aclamado no PC.
Grande parte dos jogos citados acima tiveram continuações, inclusive chegando aos consoles, porém alguns deles ficaram esquecidos no limbo até ser ressuscitado em grande estilo como aconteceu com Theme Hospital.
Por muito tempo os fãs pediram uma continuação do clássico da Bullfrog Production de 1997, que receberia um sucessor espiritual em 2018 chamado Two Point Hospital. O jogo saiu inicialmente para PC e depois chegou aos consoles, inclusive ao Gamepass, e foi (ainda é) um tremendo sucesso.
Porém não estamos aqui para falar de Two Point Hospital e sim do novo jogo do estúdio, Two Point Campus.
Conversando com um dos nossos editores, o historiador carioca Fábio Rezende, chegamos a um ponto comum, Two Point Campus nasceu com a missão de cortar as amarras que seu antecessor tinha com o clássico Theme Hospital. Saindo da temática hospitalar e abordando assuntos mais amplos e divertidos, Two Point Campus expande o universo de Two Point Hospital mas sem perder o bom humor característico da série.
O jogo foi anunciado durante o Summer Game Fest em 2021, com lançamento para Maio de 2022, porém foi adiado para Agosto do mesmo ano. Além da nova temática e inúmeras possibilidades, o maior destaque foi a chegada DAYONE no Gamepass.
Na época em que Two Point Hospital foi lançado eu não tive a oportunidade de escrever uma análise, mas mesmo depois de tantos anos posso afirmar que ele continua sendo um dos melhores jogos do gênero de simulação e gerenciamento. Além do carisma, que pra mim é um dos pontos fortes, a principal qualidade do jogo é a liberdade absurda em tratar um tema tão delicado, como a saúde de pessoas.
Mas será que tudo isso foi mantido em Two Point Campus? Posso afirmar que boa parte sim, porém algumas coisas foram simplificadas, até demais, muito provavelmente para tornar o jogo mais acessível e descomplicado.
Construa sua história
Como já era de se imaginar, o jogo não possui uma “história” com começo, meio e fim pré-definidos como em outras aventuras lineares. Em Two Point Campus você é responsável não apenas pela sua história como gestor, mas principalmente pela história de cada um dos estudantes.
O jogo é dividido em cenários que você vai desbloqueando conforme avança na conclusão de certos objetivos. O primeiro cenário apresenta ao jogador os comandos básicos por meio de um tutorial bem simples, ao completar esta etapa você recebe uma estrela e automaticamente desbloqueia um novo cenário.
Porém os verdadeiros desafios são apresentados na conquista das próximas estrelas, ao total são três estrelas em cada cenário e mais alguns objetivos ocultos. Diferentemente da primeira estrela que ensina como construir uma sala de aula, contratar professores e conhecer os comandos, é na segunda e terceira estrela que você vai realmente entender como manter um fluxo sustentável de negócios.
Por exemplo, um dos desafios da segunda estrela é fazer com que X % de estudantes consigam a nota B na matéria. Porém para isso não basta apenas criar a sala e colocar o professor dentro dela para dar aula, será preciso uma certa combinação de ações e resultados. O salário do professor deve estar no mesmo nível de conhecimento, as salas de aula devem ter todos os instrumentos para o estudante desenvolver novas habilidades, o campus deve ter lugares confortáveis para eles repousarem, fazerem sua higiene, e assim por diante.
Além de tornar-se um especialista em gerenciamento de negócios, você precisa aprender a lidar com os mais variados perfis de estudantes, nem tudo o que está bom para um está bom para outro. Você vai precisar encontrar um meio termo entre agradar os estudantes, sem comprometer o planejamento financeiro.
Liberdade vs autonomia
O jogo possui dois modos principais, o primeiro é a campanha onde você progride por cenários conforme avança nos desafios, e o segundo é o sandbox, onde é possível selecionar cenários, níveis de desafio, dificuldade etc.
Eu geralmente costumo partir para o modo sandbox assim que finalizo o modo campanha, até mesmo porque, neste ponto, você já está ambientado com as mecânicas e comandos, o que é essencial neste tipo de jogo. Seja optando pelo modo criativo onde você tem mais recursos para gerir o campus sem se preocupar com as consequências, ou nos desafios, onde sua habilidade de gerir o negócio será posto à prova, a diversão é garantida.
Um ponto interessante em ambos os modos, é que nem sempre autonomia e liberdade andam de mãos dadas. Assim como na vida real, você precisa tomar cuidado com as consequências de suas decisões. Escolhas erradas podem atrasar ligeiramente sua caminhada até a consagração suprema como um bom administrador do campus.
Para alcançar as metas e cumprir os desafios do campus, nem sempre dizer SIM é a melhor resposta. Estudantes e colaboradores vivem fazendo solicitações, mas nem sempre você deve aprovar, um simples reajuste de salário pode colocar por água abaixo o planejamento do próximo ano.
No terceiro cenário eu passei por um problema bobo, fruto por falta de malícia em resolver os conflitos, e isso me custou 2 anos de rédea curta no gerenciamento para colocar as finanças em dia. Um dos desafios era fazer com que a turma do curso de robótica tivesse aprovação superior a 70%.Minha primeira medida foi verificar o salário dos professores, alguns estavam normais e outros estavam abaixo, eis que eu resolvi subir o salário de TODOS os professores até que eles ficassem “felizes”, tem um ícone que mostra este status.
Porém eu não me atentei que o fim de ano letivo estava chegando, e este aumento impactou as finanças do campus, resultando na falta de fundos para ampliar as salas do próximo ano. Resumo da história, como não era possível voltar atrás com os aumentos de salário eu precisei reestruturar a maioria das salas e vender equipamentos desnecessários, tudo isso para poder cumprir com as metas de estruturas básica para o início do próximo ano letivo.
Por um lado isso serviu como um aprendizado para os próximos cenários, que também foram difíceis, é verdade, mas sem cometer este erro novamente tudo ficou mais fácil.
Complexo mas descomplicado
No começo do texto eu disse que Two Point Hospital tinha muitos laços com Theme Hospital, afinal o jogo da Bullfrog era bem complexo, um jogo a frente do seu tempo, por isso se tornou tão relevante. Two Point Hospital quando foi lançado tinha a mesma complexidade, porém contando com controles melhores que fazia tudo ficar mais fácil.
Two Point Campus, por ser um jogo multiplataforma, teve uma melhora significativa nos controles. Os comandos estão sempre “na mão”, você tem a divisão dos botões distribuídos na tela de forma muito intuitiva. Two Point Campus é prático e confortável de se jogar, mesmo quando a operação parece ser burocrática.
A temática também ajudou bastante a descomplicar algumas coisas, abrindo mão de detalhes mais específicos de gerenciamento como escolher o preço dos produtos oferecidos nas máquinas de guloseimas, presente em Two Point Hospital.
Mas isso não significa que o jogo se torna fácil ou raso, muito pelo contrário, como eu disse ele abre a mão destes detalhes burocráticos para focar em outros pontos mais importantes para a nova temática. Manter o bom funcionamento do campus não é uma tarefa fácil, para completar os desafios diários o jogador vai precisar de muito criatividade e malícia.
Para isso você vai dedicar mais tempo na análise e contratação de profissionais, criar salas de treinamento para melhorar e/ou adquirir novas habilidades. Tudo isso aumenta muito suas chances de sucesso na empreitada de gerenciar com excelência o campus.
Visuais e questões sonoras
Mesmo não recebendo mudanças substanciais no estilo visual, ainda sim é possível notar melhorias significativas na qualidade, principalmente na versão para a nova geração de consoles, que valoriza tudo o que as novas tecnologias podem oferecer.
Constantemente me peguei aplicando zoom máximo nas construções das salas, notando os detalhes de cada item, como sofás, bebedouros, máquinas de arcade, decorações e muito mais. Inclusive a abundância de objetos faz com que o “trabalho” de decorar os ambientes seja mais estratégico do que estético, afinal de contas, salas mais atrativas rendem bônus e melhoram a reputação (nível) do campus.
A questão sonora também chama a atenção, não apenas pelos recados bem humorados dos auto-falantes, mas principalmente pela excelente mixagem de sonorização dos múltiplos ambientes. Nota-se que existe um trabalho organizado para não parecer um amontoado de ruídos.
Outro ponto forte do jogo é a localização em português brasileiro por meio de legendas. Mesmo com os áudios em inglês a localização é perfeita, adaptando de forma clara vários termos do jogo.
Para finalizar temos a parte de performance do jogo, mesmo rodando no Xbox Series X é possível notar quedas de frame, principalmente quando você expande o zoom para conferir o campus mais abertamente. Também existe lentidão na mudança de um ano para outro e problemas de sobreposição com a câmera baixa, principalmente em ambientes onde existem muitos itens, mas nada que comprometa a diversão, afinal de contas é um jogo de gerenciamento e não um simulador de corridas.
Conclusão
Como eu imaginava, Two Point Campus amplia em vários aspectos o jogo anterior, estabelecendo um novo padrão de qualidade para este estilo de jogo. Mesmo não arriscando em grandes mudanças visuais, o jogo consolida uma identidade própria, recheada de carisma, destacando-se dos demais jogos disponíveis no mercado.
A mudança nas mecânicas acertou em cheio, tornando o jogo ainda mais equilibrado e acessível para qualquer pessoa se divertir. Mesmo que você não seja um expert em contas, taxas e gerenciamento, dificilmente será punido a ponto de cair em um loop de endividamento que não possa ser revertido.
Por muito tempo os simuladores de gerenciamento de negócios sofrem com a burocracia de comandos e complexidade, algo que distancia grande parte dos jogadores que não são fãs deste tipo de jogo. Two Point Campus aposta em uma abordagem mais simples e funcional, conseguindo mostrar o lado divertido da coisa.
Two Point Campus apresenta uma nova abordagem nos jogos de gerenciamento de negócio, levando o jogador pelas mãos até o ponto aonde o jogo fica realmente divertido. Isso é essencial para que todos os jogadores possam aproveitar ao máximo tudo o que ele oferece.
Seja você um fã ou não de jogos de gerenciamento, dê uma chance a Two Point Campus, eu tenho certeza que você não vai se arrepender em passar dezenas de horas neste “novo modelo” de simulador e sair satisfeito em completar os desafios que o jogo apresenta.
Esta análise só foi possível graças a Sega Europe e a Theogames PR, que gentilmente nos disponibilizaram uma cópia para avaliação do jogo, fica aqui o nosso agradecimento pela confiança. O jogo já está disponível para Xbox One e Xbox Series X|S e pode ser adquirido por meio do nosso link afiliado no final desta análise. O jogo também está disponível para assinantes do Xbox Game Pass.