Uma história sobre relacionamento
Divórcios… no ano de 2020, cerca de 50 mil pessoas no Brasil entraram com processos de separação. Bom para advogados, péssimo para as crianças, que no final das contas são as que mais sofrem nesse tipo de transição conjugal.
It Takes Two se amarra em um drama comum em famílias do mundo todo e o impacto disso em uma criança, mas vai além ao colocar de forma lúdica e animada os problemas de relacionamento de um casal em transição de divórcio, colocando-os em uma situação onde só a colaboração e o amor de ambos podem mudar as coisas. E cabe ao jogador partir em uma longa aventura de auto conhecimento e reparação, tudo para fazer a pequena filha do casal sorrir novamente.
A palavra é COO-PE-RA-ÇÃO
A Hazelight é uma desenvolvedora interessante, em seu título anterior, A Way Out, eles tinham feito algo inusitado, que foi desenvolver uma aventura cooperativa onde os protagonistas não precisavam ficar o tempo todo “juntos” no mesmo cenário para desenvolver a narrativa do jogo.
O mais interessante disso tudo é que A Way Out foi só um laboratório para algo mais grandioso e inventivo que viria em seguida. It Takes Two é uma bonita e deliciosa aventura cooperativa, que vai te colocar em situações imprevisíveis a todo momento, e também arrancar suspiros dos mais diversos sentimentos.
No jogo você controla Cody e May, um casal em separação conjugal transformados em suas versões de brinquedos, bonecos artesanais criados pela Rose, a filha do casal, que induziu involuntariamente um feitiço após chorar sob os bonecos em um momento de tristeza. Juntos nessa aventura, o casal é guiado pelo irritante Dr. Hakim, o Livro do Amor.
Assim, a temática de seção da tarde permeia todo o jogo, colocando o jogador nas mais diversas situações absurdas por toda a casa da família, em uma espécie de mundo paralelo explorando cômodos, brinquedos e a imaginação da pequena Rose.
É bom lembrar que o jogo é obrigatoriamente cooperativo, então cabe ao jogador escolher um amigo no sofá ou na internet para jogar. E a cooperação é um elemento crucial aqui, pois apesar de não apresentar grandes dificuldades, inclusive com checkpoints generosos, o game força jogadores a colaborarem totalmente para avançar no jogo. Para facilitar a sua vida, o jogo ainda conta com o vantajoso recurso “Passe de Amigo“, onde você pode convidar um amigo para jogar com vc utilizando apenas uma cópia do jogo, ou seja, compre It Takes Two e jogue com um amigo que não vai precisar pagar pelo game.
Surpreendente e imprevisível
Quando analiso um jogo, acho importante ir além dos aspectos técnicos e focar principalmente na experiência pessoal. No caso aqui, é extremamente importante falar sobre o ótimo sentimento de nostalgia e aventura que It Takes Two passa, temos aqui uma aventura recheada de descobertas e situações inusitadas, uma verdadeira viagem no melhor estilo “Seção da tarde”, e isso já vale pra recomendar o game pra muita gente que cresceu assistindo aventuras como Goonies e Indiana Jones.
Falando em aventura, ao longo da minha jornada de jogador, poucas vezes eu fui tão confrontado em mudar a maneira de jogar como em It Takes Two, talvez em outras épocas, como em jogos como WarioWare, isso acontecia, mas nunca de maneira tão orgânica como acontece aqui. Isso porque durante o game, que basicamente é um jogo de plataforma 3D linear, os dois jogadores irão constantemente mudar de mecânica e utilizar essas mecânicas para resolver puzzles e evoluir no game.
E essa característica é a mais gostosa no jogo, uma hora você estará deslizando em trilhos de forma radical, em outras você estará usando armas contra bichos diversos, às vezes o jogo te coloca em um hack and slash no estilo Diablo, em outras no estilo Street Fighter, aqui não existe padrão nenhum, e isso enriquece ainda mais a experiência pois tudo é feito de forma muito bem pensada, não dando espaço para o marasmo.
Além da variada jogabilidade, o game presenteia os jogadores com diversos mini-games no meio da aventura, esses mini-games dão ainda mais variedade para sua aventura. Além deles, vale também os inúmeros easter eggs espalhados pelo jogo, é uma delícia lembrar de brinquedos antigos espalhados pelo game.
Outro destaque vai para os chefes, que seguem aquele padrão gostoso de jogos clássicos de plataforma, incluindo subchefes no meio da aventura e chefes maiores nos finais. E os chefes se destacam pela criatividade em utilizar as mecânicas aprendidas na fase, algo muito comum em jogos da Nintendo por exemplo, e que aqui ganham essa mesma magia, acertaram bem!
Muitas cores e muito carisma
É legal destacar a qualidade dos cenários do jogo, o jogo se inspira em filmes como Toy Story para criar um cenário com objetos em escala monstruosas, absolutamente coloridos e em alguns momentos deslumbrantes. O design dos personagens que você encontra no meio da aventura também merecem menção, apresentando um carisma irresistível.
O design dos personagens principais também são bem detalhados, com misturas de materiais artesanais como madeira, papel machê e tricô. Além disso eles possuem boas expressões faciais, ainda se tratando de um jogo indie. Parece que, diferente de outros casos aí afora, a compra da EA fez bem para Hazelight, pois permitiu que mesmo sendo um jogo indie, It Takes To é cheio de cuidado e com bom valor de produção, digno de grandes games.
Vale ressaltar aqui também a infinidade de puzzles durante o game, alguns absolutamente criativos brincando com elementos como peso, gravidade, lógica e até mesmo matemática, tudo bem dosado para não frustrar jogadores menores, mas complexos o suficiente para não menosprezar a inteligência do jogador. É impossível não jogar e não se lembrar de jogos que também foram felizes nisso, como Little Big Planet e Super Mario Odyssey.
Aventura quase perfeita
Recheado de momentos memoráveis, It Takes To arranca lágrimas, sorrisos e algumas vezes até remorso (quem jogou vai entender), ainda sim, a aventura tem algumas oscilações de ritmo, principalmente na parte final, onde o jogo perde um pouco de brilho nos cenários e nas mecânicas antes de voltar a brilhar, quebra de ritmo ao ponto de eu ter que insistir pro meu parceiro de jogo (meu filho de 8 anos) prosseguir , o que indicou na minha visão que algumas partes se alongam demais, mesmo não sendo um jogo muito grande.
Ainda sim, It Takes Two brilha na sua narrativa, muito por causa da sensibilidade com que trata assuntos como divórcio, depressão e procrastinação, apresentando uma certa leveza e humor mesmo trazendo consigo um personagem absolutamente irritante como o Livro do Amor. Acontece que o jogo acerta na dose ao trazer uma história que vai agradar crianças e também adultos, apesar de ter faltado aquela dublagem em PT-BR caprichada que só o brasileiro sabe fazer, não é EA?
No final das contas, o balanço é de grata surpresa, e se o jogo não inova em muitos aspectos, ele se torna facilmente uma das gratas surpresas do ano, com uma das aventuras lineares mais cativantes e bem elaboradas dos últimos anos.
It Takes Two tem tudo pra entrar de vez no seu coração, e inclusive até mesmo salvar alguns casamentos 🙂
Esta análise só foi possível graças a Hazelight Studios e a Eletronic Arts, que gentilmente nos disponibilizaram uma cópia para avaliação do jogo, fica aqui o nosso agradecimento pela confiança. O jogo já está disponível para Xbox One e Xbox Series X|S e pode ser adquirido por meio do nosso link afiliado no final desta análise.